quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

O que é Ceticismo, afinal?

por Michael Shermer
Tradução: Felipe Nogueira Barbara de Oliveira

Como editor da revista Skeptic, frequentemente sou questionado o que eu quero dizer por ceticismo, e se sou cético sobre tudo ou se eu acredito em alguma coisa. Ceticismo não é uma posição que você toma antes do tempo e permanece com ela não importa o que acontecer.

Considere aquecimento global: Você é um cético quanto ao aquecimento global? Ou você é um cético dos céticos do aquecimento global? Nesse caso, eu era um cético do aquecimento global, mas agora sou um cético dos céticos do aquecimento global, o que me faz acreditar no aquecimento global baseado nos fatos como eu os entendo no momento. A parte "no momento" é o que torna as conclusões da ciência e ceticismo como provisórias.

Então, ciência e ceticismo são sinônimos, e em ambos casos não há problema em mudar de ideia se a evidência mudar. Tudo se resume à pergunta: Quais são os fatos favoráveis ou contrários a uma afirmação específica?

Há uma noção popular que céticos são mentes fechadas. Alguns nos chamam de cínicos. Em princípio, céticos não são mentes fechadas, nem cínicos. Nós somos curiosos, mas cautelosos.

Ou, frequentemente escuto "Ah, voce é um cético, então não acredita em nada?". Não, eu acredito em muitas coisas, desde que haja evidência e razão para acreditar. Por exemplo:
  • acredito na teoria microbiana das doenças;
  • acredito que vacinas são boas para saúde social;
  • acredito que água fluoretada reduz cáries;
  • acredito na teoria do Big Bang do universo;
  • acredito que teoria da evolução melhor explica a vida;
  • acredito que a teoria das placas tectônicas melhor explica os continentes;
  • acredito que a tabela periódica dos elementos melhor explica a química;
  • acredito que JFK foi assassinado por um único homem armado chamado Lee Harvey Oswald;
  • acredito que aliens provavelmente estão lá fora em algum lugar, mas eles não visitaram a Terra.
Ser um cético apenas significa ser racional e empírico. O Oxford English Dictionary (Dicionário de Inglês de Oxford) fornece o seguinte uso histórico da palavra skeptic (cético, em inglês):

"Alguém que duvida da validade de quais afirmações são consideradas conhecimento em algum departamento particular de inquisição, alguém que mantém a atitude de dúvida em referência a uma questão particular ou afirmação". E "um buscador atrás da verdade, um inquiridor que não chegou ainda a conclusões definitivas".

Ceticismo não é "procure e vamos encontrar", mas "procure e mantenha uma mente aberta". Mas o que ter uma menta aberta quer dizer? É encontrar o equilíbrio essencial entre ortodoxia e heresia, entre o total compromisso com o status quo e a busca cega por novas idéias, entre ser mente aberta o suficiente para aceitar novas idéias e ter a mente muito aberta a ponto do cérebro "sair". Ceticismo é encontrar esse equilíbrio. Esta é uma definição de ceticismo:

Ceticismo é a aplicação rigorosa da ciência e razão para testar a validade de qualquer e de todas afirmações.

Céticos questionam a validade de uma afirmação em particular, exigindo a evidência para prová-la ou desprová-la. Em outras palavras, céticos são de Missouri - o estado "Me Mostre" [Show Me é o apelido do estado de Missouri]. Quando nós céticos escutamos uma afirmação fantástica, nós dizemos, "Isso é interessante, me mostre a evidência para isso". 

Você diz acreditar no Pé Grande? Eu digo, "Isso é interessante, me mostre um corpo de uma criatura Pé Grande e eu acreditarei."

Você diz acreditar que aliens visitaram a Terra? Eu digo, "Isso é fascinante, me mostre o corpo de um alien ou destroços de uma nave espacial e eu acreditarei". 

Não é sempre fácil avaliar afirmações, então nós céticos desenvolvemos o que Carl Sagan chamou de "a arte refinada da detecção de mentiras". Inspirado por Sagan, na revista Skeptic, produzimos o que chamamos de Kit de Detecção de Mentiras, que consiste numa lista de perguntas ao encontrar uma nova afirmação. Seguem algumas: 

- A fonte da afirmação faz afirmações similares? 
Pseudocientistas têm o hábito de ir muito além dos fatos, então quando indivíduos fazem numerosas afirmações extraordinárias eles podem ser mais que iconoclastas.

- As afirmações foram verificadas por outra fonte?
Tipicamente pseudocientistas farão afirmações que não são verificadas, ou são verificadas por uma fonte pertencente ao seu próprio círculo de crença. Devemos perguntar quem está checando as afirmações, e até mesmo quem está checando os checadores? O maior problema com o desastre da fusão fria, por exemplo, não foi que Stanley Pons and Martin Fleischman estavam errados; foi que eles anunciaram a descoberta espetacular antes de ser verificada por outros laboratórios (nada menos que numa conferência de imprensa) e, pior, quando a fusão fria não foi replicada eles continuaram presos na afirmação deles. 

- Alguém procurou alguma maneira de desprovar a afirmação, ou apenas evidências confirmatórias foram procuradas?
Esse é o viés da confirmação, ou a tendência em buscar evidência confirmatória e rejeitar ou reinterpretar evidência desconfirmatória. É por isso que os métodos da ciência que enfatizam checagem e rechecagem, verificação e replicação, e especialmente buscam refutar uma afirmação, são tão necessários.

- O afirmador forneceu uma explicação diferente para um fenômeno observado, ou é estritamente um processo de negar uma explicação já existente?
Essa é uma estratégia de debate clássica - critique o seu oponente e nunca afirme o que você acredita com objetivo de evitar críticas. Mas esse estratagema é inaceitável na ciência. Céticos do Big Bang, por exemplo, ignoram a convergência de evidência desse modelo cosmológico, e focam nas poucas falhas do modelo aceito, e ainda precisam oferecer uma alternativa cosmológica viável que carregue uma preponderância de evidência a seu favor. 

- As crenças pessoais e viéses do afirmador motivaram as conclusões, ou vice-versa?
Todos os cientistas possuem crenças sociais, políticas e ideológicas que podem potencialmente enviesar suas interpretações dos dados, mas como esses viéses e crenças afetam a pesquisa deles? Em algum ponto, usualmente durante o sistema de revisão de pares, tais viéses e crenças são eliminadas, ou o artigo ou livro é rejeitado para publicação. Isso é a razão pela qual alguém não deve trabalhar num vácuo intelectual. Se você não detectar os viéses na sua pesquisa, alguém irá. 

Também no kit de ferramentas dos céticos existe um aforismo frequentemente atribuído a Carl Sagan, mas que foi dito anteriormente por outros e com várias palavras diferentes, mas independente de sua etimologia esta é uma linha que você deve se lembrar quando alguém chamar à sua atenção para uma afirmação extraordinária:

Afirmações extraordinárias requerem evidências extraordinárias

Isto é, quanto mais fantástica for a afirmação, mais cético você deve ser a não ser que a evidência seja igualmente fantástica.