sábado, 7 de novembro de 2015

Entrevista com Dr. Chris French

por David Webb
tradução: Felipe Nogueira
Fonte: http://www.all-about-psychology.com/chris-french.html

Chris French, Ph.D., é professor de psicologia e diretor da Unidade de Pesquisa de Psicologia Anomalística em Goldsmiths, na Universidade de Londres. Ele é renomado por sua pesquisa na psicologia da crença no paranormal, especialmente no seu trabalho que oferece explicações não paranormais para experiências consideradas paranormais (percepção extrassensorial, telecinese, leituras psíquicas, cura espiritual, medicina alternativa e complementar, experiências extracorpóreas e de quase-morte, astrologia e outras técnicas divinatórias, reencarnação, OVNIs e abduções alienígenas, fantasmas e espíritos demoníacos, poder do cristal e dowsing, etc). 

Consultor especial e ex-editor chefe da The Skeptic Magazine, a principal e mais antiga revista cética do Reino Unido, Professor French é frequentemente chamado pela mídia para oferecer uma perspectiva psicológica sobre várias afirmações paranormais. Ele também é colunista das páginas online de ciência do jornal Guardian

O que fez você perseguir um interesse acadêmico na psicologia das crenças paranormais? 
Afirmações paranormais sempre me fascinaram. Até meus 20 anos, na verdade, eu acreditava em muitos fenômenos paranormais. Foi lendo um livro específico no início dos anos 80, Parapsychology: Science or Magic? escrito por James Alcock, que meus olhos abriram para o fato de que existem plausíveis explicações não paranormais para experiências paranormais, muitas das quais apoiadas por boas evidências empíricas. Meu interesse aumentou com a leitura de livros escritos por Ray Hyman, James Handi, Martin Gardner e outros. Assinei a revista americana Skeptical Inquirer e na revista britânica The Skeptic (conhecida como a Skeptic britânica e irlandesa).

Embora, eu estivesse fascinado pela abordagem cética ao paranormal e às outras pseudociências, por um grande período, meu interesse era mais do que um hobby pessoal. Eu dei palestras ocasionais nesse tópico, mas não estava ativamente pesquisando na área relacionada ao meu interesse. Na época, a psicologia anomalística não era vista como um área respeitável para pesquisa séria - afinal, esses tópicos eram discutidos na TV!

Com benefício da retrospectiva, podemos ver que as atitudes começaram a mudar lentamente, graças aos esforços pioneiros de pessoas como Susan Blackmore, Robert Morris e Richard Wiseman, mas foi apenas em 1992 que eu publiquei meus primeiros artigos acadêmicos nessa área. Até mesmo nessa época, eu sentia que meu interesse nas "coisas estranhas" era tolerado mas não encorajado e eu me certificava de também publicar artigos em áreas mais tradicionais da pesquisa em psicologia.  

Eu não tenho muita certeza de quando eu decidi focar minha pesquisa completamente na psicologia anomalística, mas claramente isso aconteceu em algum momento. Eu comecei a lecionar um módulo opcional sobre psicologia anomalística como parte do programa de Bacharelado da Goldsmiths em 1995 e criei a Unidade de Pesquisa em Psicologia Anomalística em 2000. Uma das razões de criar essa unidade foi para levantar o perfil acadêmico da psicologia anomalística e, junto com isso, sua respeitabilidade acadêmica. Gosto de pensar que fomos bem-sucedidos nesses objetivos. Atualmente, quase toda minha pesquisa e atividades acadêmicas estão na área de psicologia anomalística. 

Por que as crenças paranormais entre o público são tão disseminadas? 
Há vários fatores que possuem um papel na popularidade nas crenças paranormais, mas eu acredito que o mais importante é a história evolucionária. Vários vieses cognitivos parecem estar associados com a crença no paranormal, como a nossa tendência à detecção de padrões significativos na aleatoriedade, em perceber ilusórias relações de causa e efeito, e assumir que tudo acontece porque alguém ou alguma coisa - algum agente externo consciente - queria que acontecesse. Todas essas tendências ocorrem porque estamos aplicando tendências cognitivas que, durante a nossa longa história evolucionária, nos ajudaram a ficar vivos por nos alertarem das potenciais ameaças em nosso ambiente. Dessa forma, passamos nossos genes para a próxima geração. Mas, quando essas mesmas tendências são aplicadas inadequadamente, elas podem resultar na crença em forças paranormais, terapias alternativas inúteis, fantasmas e outros seres espirituais. 

Além disso, não há dúvida de que pessoas têm experiências estranhas, como experiências extracorpóreas, experiências de quase morte, e paralisia do sono, e isso apoia certos sistemas de crença paranormal. Há também o papel de sistemas culturais de crença, especialmente religiões, que também promovem crenças paranormais de várias maneiras. O vies cognitivo mais difuso é o do viés da confirmação. Nós todos achamos fácil acreditar nas coisas que gostaríamos que fossem verdade. Quando estamos falando, por exemplo, de crença na vida após a morte, a evidência para nos convencer que é real não precisa ser tão forte para aceitarmos.     

De todas as crenças e experiências paranormais rotuladas como paranormais, quais são as mais comuns?
Há, é claro, variações entre culturas, tanto historicamente quanto geograficamente, mas em sociedades ocidentais modernas normalmente entre 30-50% da população adulta endossam a crença em um ampla variedade de fenômenos paranormais incluíndo vida após a morte, fantasmas, comunicação com mortos, telepatia, e sonos precognitivos. Uma menor mas ainda substancial parte afirmam que tiveram experiências pessoais desse fenômenos.  

Você já investigou uma experiência "paranormal" que não poderia ser explicada em termos de fatores físicos e psicológicos conhecidos ou conhecíveis?
Não estou afirmando que eu posso oferecer explicações não paranormais para cada e toda afirmação paranormal que já foi feita - e ninguém deveria afirmar isso também. Normalmente, ninguém está investigando a experiência ou o evento propriamente dito, mas o relato de alguém dessa experiência ou evento. Quem está afirmando pode ser completamente sincero, mas sabemos bem que a memória pode ser notoriamente não confiável. E é claro que fraudes intencionais ocasionalmente ocorrem. Então, afirmações anedóticas nunca serão suficientes para me convencer de que um fenômeno paranormal ocorreu. 

Resultados de experimentos controlados poderiam me convencer de que forças paranormais realmente existem. Mas, até hoje, parapsicólogos falharam em obter um único fenômeno paranormal que pode ser replicado de forma confiável. Para mim, isso fala muito alto. 

Eu normalmente encontro que, com algumas exceções, afirmações paranormais ficam menos e menos convincentes à medida de que alguém entra nos detalhes da afirmação. Mas uma parte importante do ceticismo é estar sempre aberto à possibilidade de que novas evidências apareçam e provam alguém errado. Por essa razão, continuaremos a testar afirmações paranormais da forma mais justa possível, apesar do fato de que nenhum dos nossos testes anteriores sequer produziu alguma evidência convincente para apoiar crenças paranormais. 

Na sua coluna nas páginas de ciência online do The Guardian, você publicou artigos sobre o efeito ideomotor. Pode nos contar mais a respeito desse fenômeno psicológico?
Um número de afirmações paranormais e relacionadas são explicadas plausivamente no contexto do efeito ideomotor, isso é, movimentos musculares não conscientes. Em todos os casos do efeito ideomotor, os movimentos musculares não conscientes foram causados pela crença ou sugestão. Fenômenos paranormais que podem ser explicados pelo efeito ideomotor incluem:

  • Inclinação da mesa: isso era uma mania Vitoriana envolvendo pessoas sentadas tentando a comunicação com espíritos através do posicionamento das mãos em cima de mesas de madeira redondas. Diziam que o movimento da mesa era causado por espíritos, mas o físico Michael Faraday provou conclusivamente que as pessoas sentadas estavam involuntariamente causando o movimento. 
  • Tabuleiro Ouija : outro alegado meio de comunicação com espíritos, nesse caso as pessoas sentadas colocam seus dedos em um tabuleiro que se move respondendo às perguntas, indicando letras, números e as palavras "sim" e "não", posicionadas ao redor do tabuleiro.   
  • Dowsing: uma técnica usada para diferentes propósitos, como encontrar águas em locais secos, determinar o sexo de uma criança que ainda não nasceu, e comunicação com espíritos. Diferentes métodos existem para dowsing usando dispositivos como varetas na forma de L ou Y, ou pêndulos, mas em todos os casos um pequeno movimento feito pelo dowser é convertido em um grande movimento pelo sistema em uso. Dizem que o movimento do sistema fornce a a informação requisitada. Testes duplo-cego mostrou repetidamente que isso não acontece. 
Quais que você considera como os desenvolvimentos mais significativos da disciplina desde que você fundou a Unidade de Pesquisa em Psicologia Anomalística?
Acho justo dizer que não houve nenhuma descoberta fantástica na área, mas tem o que tem ocorrido é uma acumulação de conhecimento como é refletido, ano após ano, pelo crescente número de artigos publicados, livros, conferências.
Ocorreu um aumento no ensino dos tópicos de psicologia anomalística em todos os níveis, não é por menos, porque provê um veículo interessante para favorecer as habilidades de pensamento crítico. Então, o que eu acho mais gratificante é a aceitação geral de que os tópicos abordados pela psicologia anomalística são considerados por quase todo mundo merecedores de estudo científico adequado.

Pode nos falar sobre o livro que você co-autorou com Anna Stone, Psicologia Anomalística: Explorando a Crença e Experiência Paranormais (Anomalistic Psychology: Exploring Paranormal Belief and Experience) ?

Esse livro é uma tentativa de fornecer um  rápido retrato do estado da arte da psicologia anomalística considerando cada uma das maiores subdisciplinas da psicologia em relação aos insights que podem oferecer para nos ajudar a entender crenças e experiências paranormais. Psicólogos cognitivos descreveram vários tipos de vieses relevantes para explicar porque as pessoas algumas vezes interpretam equivocadamente experiências como se envolvessem forças paranormais, quando na verdade não envolvem.

Psicólogos sociais descreveram mecanismos pelos quais crenças são transmitidas entre indivíduos. Psicólogos do desenvolvimento oferecem insights nos entendimentos das crianças em crenças supersticiosas e mágicas. A neurociência pode explicar muitas experiências paranormais em termos do que está ocorrendo no cérebro. Acredito que esse foi o primeiro livro que adotou essa abordagem e acho que enfatiza a necessidade de considerar muitos aspectos diferentes das ricas e bizarras experiências que constituem fenômenos supostamente paranormais.

Qual recomendação você daria para alguém interessado em se tornar um psicólogo anomalístico? 
É essencial ter uma base boa em psicologia como um todo, incluindo métodos de pesquisa e estatística, antes de especializar-se em psicologia anomalística. Isso é melhor feito estudando psicologia na faculdade e provavelmente seguido de um mestrado em métodos de pesquisa. Tanto no bacharelado quanto no mestrado, escolha tópicos de projetos dentro da psicologia anomalística. O próximo passo seria aplicar para um Doutorado investigando seu tópico escolhido dentro da área. Depois disso, encontre um trabalho acadêmico onde possa fazer pesquisa em qualquer tópico do seu interesse - dado que você esteja fazendo pesquisa de alta qualidade com um padrão publicável. Falar desse jeito faz parecer tudo muito fácil e simples, mas é claro que não é!

E saiba que sempre haverá uma demanda muito maior para palestras em subdisciplinas mais tradicionais da psicologia em contraste com áreas de nicho como a psicologia anomalística. No final, pesquisadores frequentemente trabalham nas suas áreas escolhidas simplesmente porque é onde seus interesses estão, não importando quais barreiras são colocadas na frente deles - e isso certamente se aplica à minha carreira de pesquisa.

Em quais os projetos de pesquisa você está trabalhando atualmente? 
Como sempre, temos diferentes projetos em diferentes etapas de desenvolvimento, mas as três áreas que ocupam a maior parte de nossos esforços de pesquisa no momento são a psicologia da crença em conspirações, memórias falsas, e paralisia do sono. Além da pesquisa propriamente dita, trabalhamos muito para o engajamento do público, através de cooperação com a mídia, organizando e contribuindo com conferências e palestras, e colaborações que misturam ciência com arte. Não há sinais de que o fascínio do público com a psicologia anomalística irá diminuir num futuro próximo.

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Nota do Tradutor: meu post sobre psicologia anomalística e sobre o livro de Chris French e Anna Stone está disponível aqui